30/04/2021 | Ed_Antes, Edição AR108

Preços internacionais continuarão em patamares elevados

Redação Agrimotor

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Roberto Betancourt, diretor titular do Departamento do Agronegócio da Fiesp, comenta os resultados do IC Agro 2020, recentemente divulgados pela entidade.

Recentemente divulgado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o Índice de Confiança do Agronegócio (IC Agro), relativo ao ano de 2020, apresentou queda em todos os segmentos pesquisados. Mas, cada um, por seus próprios motivos. Os produtores agrícolas, por exemplo, foram influenciados diretamente pela irregularidade climática observada no fim do ano passado, que fez o plantio da safra de verão ser o mais atrasado da história. No caso das agroindústrias, para algumas o aspecto preponderante foi a desvalorização do real, enquanto para outras o aumento dos custos das rações pesou mais.

Contudo, registrando 121,4 pontos, os resultados do levantamento, produzido em parceria com a CropLife – associação que reúne especialistas, instituições e empresas que atuam na análise e desenvolvimento de tecnologias nas áreas essenciais para a produção agrícola sustentável – foram comemorados pelo setor, uma vez que, pela terceira vez, o indicador fechou acima de 120 pontos ao longo de sua série histórica. Nesta entrevista exclusiva à Revista AgriMotor, Roberto Betancourt, diretor titular do Departamento do Agronegócio da Fiesp, explica, entre outras coisas, as razões desse otimismo. Confira!

Revista AgriMotor: Analisando os dados do IC Agro 2020, nota-se que, desta vez, não foi a avaliação sobre a economia brasileira que determinou a maior parte da variação do índice, diferentemente, portanto, do que se tornou comum nos últimos anos. Mesmo assim, o levantamento pontua que todos os segmentos pesquisados perderam algum grau de confiança no ano passado. Isso não seria suficiente para revelar uma tendência de queda desse quesito para 2021?
Roberto Betancourt: Não. Não podemos ver no atual recuo da confiança uma tendência de queda para este ano. Já existia uma expectativa de que houvesse uma retração no índice em relação ao terceiro trimestre de 2020, quando o indicador alcançou o melhor resultado da série histórica. Mesmo assim, esta foi apenas a terceira vez que a confiança fechou acima de 120 pontos – as duas ocasiões anteriores foram no 3º trimestre do ano passado (127 pontos) e o 4º trimestre de 2019 (123,8 pontos).

O Índice de Confiança das Indústrias inseridas na cadeia produtiva do agronegócio caiu 6 pontos do terceiro para o quarto trimestre de 2020, fechando a 116,9. Quais foram os motivos que alimentaram essa queda?
Para responder essa pergunta, é preciso novamente ressaltar que o terceiro trimestre de 2020 registrou o maior índice também para as indústrias do agronegócio, com 122,9 pontos. Entre os dois elos industriais do agronegócio (antes e depois da porteira), os motivos foram distintos. Nas indústrias de insumos agropecuários (antes da porteira), a queda foi de 9,1 pontos, resultado influenciado pela queda no ânimo do segmento de defensivos agrícolas, que não encontrou espaço para repassar ao mercado doméstico os aumentos de custos resultantes da desvalorização do real, da logística e das matérias- primas oriundas da China, entre outros motivos – como os altos estoques de produtos acumulados nas revendas. Já do lado do grupo das indústrias depois da porteira, que marcou queda de 4,7 pontos naquele período, as indústrias de alimentos concentraram o esfriamento do otimismo, devido principalmente aos altos preços da soja e do milho, que encarecem os custos das rações e, consequentemente, os do boi gordo, o que diminuiu as margens dos frigoríficos. Por outro lado, o momento relativamente melhor para as indústrias de açúcar e etanol, tradings e empresas de logística no fim do ano passado amenizou a queda no índice de confiança desse grupo.

Considerando tudo isso que você mencionou, alguma luz brilha no fim desse túnel, principalmente no que diz respeito à perspectiva de retomada da economia brasileira e mundial no pós-COVID?
Bem, não é segredo para ninguém que o mundo ainda atravessa um momento de muita incerteza e instabilidade devido à pandemia. O funcionamento dos mercados globais sofreu forte impacto, gerando sérias distorções, como o aumento exponencial dos custos de produção, das mais diversas matérias-primas que abastecem o setor industrial. A forte e surpreendente recuperação econômica da China, pegou o mundo com os estoques baixos, levando inclusive a situações de escassez. Com os insumos agropecuários houve risco de desabastecimento, especialmente quando fornecidos pela China e Índia. No caso deste segundo país, por exemplo, a indústria chegou a trabalhar com somente 30% da capacidade. E neste momento em que a Índia vive um aumento exponencial de novos casos da COVID-19, há o receio de que novas restrições à produção voltem a ocorrer, o que pode afetar vários segmentos, como o de defensivos agropecuários, entre outros. Porém, a despeito de todas as dificuldades, acreditamos que a oferta de vacinas aumentará de forma significativa no mundo, especialmente a partir do segundo semestre do ano, quando a situação tenderá a uma maior estabilidade, seja sob a óptica da saúde pública, seja sob o aspecto econômico. 

O IC Agro 2020 revela também certo “esfriamento do otimismo” das indústrias de alimentos no pós-porteira, como você já citou, motivado pelos altos custos da soja e do milho, sobre o qual, aliás, se fez uma piada nada engraçada de que “em 2020, o milho foi vendido a preço de soja, e a soja a preço de boi”. E, para piorar esse quadro, aparentemente, não há, pelo menos no curto prazo, tendência de queda nesses preços. Aliás, tanto o aumento do dólar quanto sinais como a estabilidade da Bolsa de Chicago, que determinaram ajustes nas cotações da soja no final do mês de março, apontam na direção contrária. Qual a sua aposta para os movimentos futuros nesse tabuleiro?
Tomando como referência a previsão para a safra global 2020/2021 do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) para os estoques finais de soja e milho, os números indicam volumes em queda e que, se confirmados, serão os menores desde meados de 2015 e 2016. Então, com base nesse prognóstico, sim, ao menos no curto prazo, podemos inferir que os preços internacionais seguirão sustentados em patamares elevados.

Questão relevante também para quem analisa o IC Agro 2020 é, sem dúvida, a ausência de grandes eventos significativos no âmbito do crédito, o que gerou queda de confiança em relação a ele, provavelmente motivada pelo esgotamento de algumas linhas, como foi o caso do Moderfrota. Você enxerga a possibilidade de alguma guinada positiva no radar quando o tema é financiamento do agronegócio, o que poderia, eventualmente, gerar aumento dos índices de confiança nele?
O Crédito Rural foi, e seguirá sendo, um importante instrumento propulsor do agronegócio brasileiro. O que estamos presenciando é uma maior participação dos instrumentos de financiamento com juros livres e, nesse cenário, a sinalização do governo e do Congresso na direção da responsabilidade fiscal é absolutamente vital, para que a taxa Selic não sofra uma apreciação que venha a impedir o desenvolvimento desta modalidade de crédito. Um cenário de aumento da inflação, seguido pela elevação da taxa de juros da economia, somada à situação fiscal do governo federal, pode ser altamente prejudicial à concessão de crédito, tanto público quanto privado. Não digo que este cenário seja o provável, mas ele começa a entrar no radar e, caso ameace se concretizar, passa a ter o potencial de derrubar, para longe, a confiança recorde que temos observado nos últimos levantamentos.

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Há mais de 15 anos a revista Agrimotor apresenta os assuntos mais recentes do setor do Agronegócio nacional.
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