Por Décio Luiz Gazzoni, Engenheiro Agrônomo, membro do Conselho Agro Sustentável
O agro pode melhorar ou piorar dependendo do clima e da situação internacional. O próximo governo brasileiro pouco interferirá.
O Brasil ruma para um protagonismo inédito, tanto na produção quanto na comercialização de produtos agrícolas. Nosso agro ganhou vida e dinâmica próprias. Dado o seu tamanho, sua dependência do mercado doméstico, em termos relativos, é cada vez menor. Assim, a situação de oferta e demanda nos demais países passa a ser determinante para o maior ou menor crescimento do agro brasileiro. Instabilidades na geopolítica internacional, crises de abastecimento, taxa de desenvolvimento do PIB (e da renda per capita) em escala global, são fatores determinantes para os rumos do nosso agro no futuro imediato.
Não menos importantes são as mudanças climáticas, tanto cá quanto alhures. Os eventos climáticos extremos estão se tornando cada vez mais frequentes, com secas prolongadas, períodos mais longos de temperatura muito elevada, enchentes e inundações, tempestades, vendavais e outros fenômenos adversos. São eventos que prejudicam a produção agrícola, impedindo semeadura na época mais propícia, por vezes requerendo nova semeadura. Prejudicam operações de manejo, favorecem ataques de determinadas pragas, frustram colheitas.
Para que o agro brasileiro continue crescendo às mesmas taxas dos últimos 20 anos, precisamos, essencialmente de duas coisas: que o mundo cresça e compre mais nossos produtos. Em consequência, que os preços sejam remuneradores. E que o clima não nos atrapalhe, permitindo que haja produção compatível com a demanda.
Governo
E o novo governo? Não o vislumbro como um agente que possa interferir no agro com a mesma intensidade que os dois fatores acima. Poderá ajudar muito, mas não prejudicar. O agro brasileiro adquiriu uma expressão e uma dinâmica próprias, com cadeias e conexões solidamente vinculadas ao mercado, cada vez mais se descola das ações governamentais. Ganha progressivamente mais força a expressão “quanto menos governo, melhor”! Eu diria que o governo passou a depender mais do agro do que este do governo!
Sem dúvida algumas ações de governo são essenciais. Destacaria a primordial, que é a defesa agropecuária que, por força de acordos internacionais, precisa ser capitaneada pelo governo de cada país, para assegurar o ingresso de nossos produtos no mercado internacional. Trabalho de coordenação, integrado com o setor privado. Duas outras ações, no âmbito do Ministério da Agricultura são essenciais: geração e transferência de tecnologia e política agrícola.
A Embrapa é um órgão do MAPA que tem sido reconhecido como um dos grandes responsáveis pela revolução que ocorreu no agro brasileiro, nos últimos 40 anos. Nas sábias palavras do mestre Xico Graziano “Reanimar e revalorizar a Embrapa, o maior orgulho do agro nacional, é a mais difícil tarefa do próximo governo”. Obviamente Xico restringia sua análise ao agro e não aos demais setores do governo. Quanto à assistência técnica, a correia de transmissão da informação para os produtores rurais, o setor privado se organiza de forma cada vez mais adequada para atender às suas necessidades.
Resta uma ação no âmbito do MAPA, que depende em muito do governo: a proteção e o apoio ao pequeno agricultor, que ainda não esteja adequadamente vinculado às cadeias produtivas do agro, com ações como crédito, apoio à organização e associativismo, e assistência técnica.
É fora do âmbito do Ministério da Agricultura que vislumbro os aspectos nos quais o governo mais pode ajudar o agro brasileiro a obter um novo salto de patamar, tanto no mercado doméstico, quanto internacional. Listo as principais iniciativas que podem nos ajudar:
1 – Integração do agro às ações de proteção ao meio ambiente, com o cumprimento do Código Florestal e o apoio aos programas que buscam sistemas de produção cada vez mais sustentáveis, particularmente na redução das emissões de carbono para a atmosfera, o que inclui o mercado de carbono e o pagamento por serviços ambientais;
2 – Abertura de novos mercados e consolidação dos existentes, novas oportunidades de ocupação de espaços mercadológicos, como bioeconomia, aquicultura, fruticultura e plantas ornamentais;
3 – Investimentos em infraestrutura e logística para o transporte de insumos, estocagem e escoamento de safras, o que abarca silos e armazéns, hidrovias, ferrovias, rodovias, portos e aeroportos à altura da pujança do agro brasileiro;
4 – Investimentos em energia, comunicação e avanços tecnológicos para que os sistemas de produção e as cadeias produtivas possam operar no estado da arte;
5 – Redução do custo Brasil, que inclui reformas, desburocratização e apoio às ações para tornar o agro brasileiro cada vez mais competitivo.
Uma necessidade sempre presente em um setor que atinge um terço do PIB, responsável pela integralidade do saldo comercial, pelo emprego e renda de dezenas de milhões de brasileiros, é a comunicação. Comunicar adequadamente o que é o agro nacional, livre das fakenews e dos mitos, tanto no Brasil quanto no exterior, é uma ação que deve integrar governo e iniciativa privada.
Não desconheço a fragilidade das contas públicas face ao tamanho das demandas do agro. Mas vislumbro uma oportunidade histórica de capturar portentosos investimentos internacionais para resgatar a deficiência crônica em nossa infraestrutura e logística, na forma de PPAs ou outras modalidades.
Quanto ao nosso produtor e demais elos da cadeia, projeto que manterão o foco em ser o melhor do mundo, produzindo de forma sustentável, com produtividade crescente, para diminuir cada vez mais a abertura de novas áreas, sempre atento às demandas do mercado e dos governos de outros países, cada vez mais exigentes nos critérios de sustentabilidade.
De minha parte, não tenho qualquer dúvida que, daqui a quatro anos, estaremos ainda melhor do que estamos hoje, independente da forma de avaliação que viermos a utilizar.
Fonte: CCAS